Já fui árvore e árvore ainda sou
Vagueando
Não nasci assim, torta. Entortaram-me.
Não nasci assim seca, secaram-me.
Não era deste tamanho, cresci.
Não fui como estou, mas agora sou.
Não era daqui, viajei para cá.
Não era árvore, era semente.
Já não sou senciente, nem doente, nem sequer estou dormente, morri, não sendo gente. Morri, pasme-se de pé, assim, como me ainda vê, depois de muito retorcida pelo vento.
Estou morta, na paisagem tratam-me por resistente.
Estou sem vida como se vê, dou vivas à vida que me vê.
Sou um peso morto, apoio o peso da vida de outras espécies que se agarram a mim, como se eu, morta, fosse a sua tábua de salvação.
Sou abraçada por caminhantes, que não se podem agora abraçar, fotografada por curiosidade, quiçá por me acharem bela, observada por muitos, idolatrada por paisagistas, pintada por artistas, que me chamam natureza morta.
Já não sinto o vento a retorcer-me nem abanar-me, já não sinto o frio a gelar-me, nem a chuva a molhar-me, apenas percebo que sou torta, depois de morta, quem se importa!