Imaginemos que o Primeiro-ministro António Costa teria feito, no início deste ano, um discurso onde sugeria aos empresários portugueses que abandonassem a sua zona de conforto e se fossem instalar no interior do país, mais precisamente em Campo Maior.
O primeiro “ruído” seria nas redes sociais, onde para além de se desdenhar da ideia e de se afirmar que os socialistas são muito bons a fazer obra com o dinheiro dos outros e eram também lançados os impropérios típicos desta forma de comunicar.
O segundo “ruído” (supostamente) mais sério, viria da classe empresarial. Alegaria que não existiamm condições, porque é longe, a logística seria complicada, existiriam dificuldades em captar mão-de-obra especializada, faltavam infraestruturas adequadas e que o governo nem sequer tinha admitido conceder incentivos, apoios, benefícios fiscais para quem decidisse avançar com projetos.
O terceiro “ruído” viria dos comentadores, politólogos, economistas e outros que agora não me lembro, que apoiariam ou criticariam a ideia, consoante as suas convicções políticas ou as suas conveniências, apresentando um sem número de argumentos para demonstrar a inexequibilidade da coisa.
A Oposição seria responsável pelo derradeiro “ruído” interessada que sempre está (independentemente da sua composição partidária) em arranjar argumentos que fragilizem uma proposta de qualquer governo, do que procurar consensos que a eventualmente a melhorassem.
E “prontos” depois de um grande show e de várias parangonas em jornais e pasquins, eis que se voltava ao rame rame do costume, tudo como dantes quartel-general em Abrantes.
O que refiro acima não andaria longe da verdade, se a sugestão tivesse ocorrido e transporta-nos para um final com uma moral – É por isto que o país não cresce, não sai da cepa torta e até os romanos já nos tinham topado quando afirmaram, que para lá da Gália há um país que não se governa nem se deixa governar.
Recuemos então no tempo.
Por volta de 1944, vigorava em Portugal um regime fascista, existiam grandes dificuldades económicas e pobreza extrema, a maioria da população, em especial, no interior era analfabeta, não existiam políticas sociais, muito menos infraestruturas, nomeadamente vias de comunicação, o país vizinho tinha saído de uma guerra, havia fome que era bem sentida em Campo Maior.
No meio de tanta adversidade, um Homem, com apenas a Quarta Classe, lança-se no negócio de café nesta Vila raiana e acaba por construir um Império.
O Homem, Manuel Rui Azinhais Nabeiro, fez o impensável, não só conseguiu transformar um pequeno negócio num grande império como o fez de forma tão diferente dos conceitos de hoje, definidos como as boas práticas de gestão empresarial. Criou a primeira empresa com o seu nome em 1961, recorrendo a poupanças e a um empréstimo. Duvido que nos dias de hoje, algum Banco lhe concedesse um empréstimo para o mesmo efeito e nas mesmas condições.
Rara é a semana em que muitos empresários a operar perto dos grandes centros urbanos, não se queixam das condições atuais, afirmando não ser nada fácil erguer e manter empresas em Portugal, nomeadamente devido à burocracia e à carga fiscal. Admitindo que possa ser verdade, podemos imaginar as dificuldades que Rui Nabeiro enfrentou ao longo da sua vida de empresário que, mesmo na altura da pandemia, se recusou a pedir ajuda ao Estado, para pagar aos seus funcionários que não foram despedidos.
Rui Nabeiro conseguiu ter sucesso, no interior do país, no Alentejo profundo, relacionando-se com regimes políticos totalitários e democráticos, foi político, presidente da Câmara de Campo Maior e esteve ligado ao Futebol, sendo que o seu clube, o Campo Maiorense, que chegou a militar na Primeira Divisão Nacional. Em suma fez aquilo a que hoje, de forma negativa, apelidamos de Portas Giratórias entre a política, o futebol e o setor privado, sem se deixar manchar pela suspeita que estas passagens, nos dias de hoje são notícia pela pior das razões.
Foi socialista, amigo de Mário Soares e Jorge Sampaio teve sucesso com governos socialistas e não socialistas, provando que o sucesso e os bons resultados económicos também ocorrem com governos socialistas e com gente de pensamento político próximo da esquerda.
Atravessou sem grandes sobressaltos o PREC, no Alentejo, bastião do comunismo, usou de mão-de-obra alentejana, a tal que tem fama de não gostar de trabalhar.
A aprovação de um voto de pesar, por unanimidade na Assembleia da República, evidencia o respeito de todos os partidos políticos, lhe devem. Serviu o interior do País e a sua população, distribuindo riqueza e satisfazendo necessidade básicas, dinamizou vila de Campo Maior, muito mais do que quaisquer políticas conseguiram fazer noutra vila do interior e tornou-se uma referência no negócio do cafés que ultrapassou fronteiras.
Deixou marcas positivas no País vizinho, nomeadamente em Badajoz, que agora o quer reconhecer como filho adotivo, onde se chegou a refugiar uma ordem de prisão por alegada fuga aos impostos, da qual foi absolvido.
Este Homem, foi o Maior do seu Campo de atuação, ao conseguir fazer o que fez, com o apoio da sua família, dos seus empregados, dos seus amigos, dos seus clientes, em Campo Maior. Talvez se os empresários seguissem o seu exemplo, não fossem necessários Códigos de Ética e de Conduta nas empresas, nem tanta regulação e leis, nem existiram tantas queixas de que a justiça não funciona.
Espalhou simpatia, simplicidade e generosidade, foi o rosto sorridente daquilo que supostamente era impossível fazer no interior de um País pequeno, dignificando-o.
Embora tenha ido diversas vezes a Campo Maior e até visitado a Adega Mayor, nunca tive a honra de conhecer Rui Nabeiro. No entanto, através da leitura do livro Almoço de Domingo de José Luís Peixoto tenha percebido a sua sabedoria, grandeza e generosidade.
Deixo já uma sugestão para a palavra do ano de 2023, “Exemplo” porque Nabeiro é um bom exemplo daquilo que deveria ser o comportamento de todos nós, em especial empresários e/ou empreendedores que perseguem e bem o lucro, mas deviam de fugir da ganância.
E para rematar não posso deixar de salientar o cartoon de Henri Cartoon Qualidade Pos Vida sobre Rui Nabeiro que me parece ser um resumo perfeito da vida do comendador e do seu legado.