Almoço num dia de Junho, no Restaurante Bristol, com bom tempo o que em Sintra quer dizer, sem nevoeiro e sem vento. Não se vê uma pessoa ou um carro na estrada da Volta do Duche.
Regresso sem inspiração e sem gana o que é contra a minha vontade. Nem consigo explicar porquê. Talvez venha para aqui desabafar, meditar, lamentar, buscar, passar o tempo ou, quem sabe, à procura de encontrar uma qualquer motivação ou emoção.
Este novo normal faz-me muito mal, afecta-me a moral.
A falta de vida em Sintra deixa-me triste, a falta de gente aborrece-me, a falta de movimento faz-me sentir morto, a falta de tudo o que mexe deixa-me com stress, a falta de som irrita-me.
Não há quem se me dirija a perguntar como se chega ao Castelo ou ao Palácio, não há quem me pergunte onde comer as melhores queijadas, não há quem me questione onde consegue estacionar o carro, não há quem me diga, mas Sintra é assim todos os dias, não há quem me peça para lhe tirar uma foto (em abono da verdade já era raro por causa da mania das selfies).
Os passeios estão a ficar flácidos porque não são pisados, as escadarias não gostam de ver os seus degraus ao deus dará, os corrimãos querem ser agarrados, os monumentos não têm audiência para contar as suas histórias, as árvores fazem sombra que ninguém aproveita, a água corre pelos riachos sem testemunhas nem árbitros que confirmem que passou por ali, as dobradiças estão desempregadas e em risco de reumatite permanente, as fechaduras estão fartas de estar fechadas, as portas há muito que não se mexem, algumas já estão a engordar, os vidros continuam transparentes mas ninguém vê para dentro ou para fora, os postigos estão fartos de tapar a luz do sol, os tapetes estão fartos de estar enroladas, os capachos sentem-se humilhados por ninguém lhes esfregar os sapatos, os semáforos estão cansados de dar ordem de paragem ou de passagem sem que ninguém lhes ligue, as fontes sentem-se abandonadas, as mesas anseiam por uma toalha.
Resta-me a paisagem verde ,que parece ser a única coisa viva à minha volta.
Sinto que me largaram de repente num deserto sem areia, cuja travessia vai ser longa e dolorosa para todos.
Sinto que passámos do 80 para o 8 e termino por aqui. Se um disco voador aterrasse hoje em Sintra, na Volta do Duche, no Castelo ou no Palácio, não estaria cá ninguém para testemunhar.
Vai na volta, preciso mesmo de um duche, estarei a sonhar?